quarta-feira, 16 de maio de 2018

Vitória de José Eliton pode abrir um novo ciclo político pra aliados e adversários


Há ideias falsas — ou ideias fora do lugar, digamos — que, de tão repetidas, se tornam “verdades”. Verdades aderentes mais ao discurso do que à realidade. Um dos mitos é que os chamados ciclos políticos incontornáveis — tese derivada, possivelmente, da rigidez filosófica do positivismo (a ideia de progresso linear, com escassas nuances e contornos). Em 2014, quando completava um “ciclo” de 16 anos no poder, o grupo do então governador Marconi Perillo (PSDB), pela lógica incongruente, seria retirado do poder. Foi? Não. Por quê?
Porque, como afiançam os filósofos ingleses Isaiah Berlin e John Gray, a lógica progressiva e linear é mera ficção retórica não sustentada pela história. A intervenção dos homens, colocando seu dedo na história, costuma mudar conceitos rígidos e pensamentos que, embora pareçam “vivos”, são “natimortos”. A “teoria dos ciclos” foi posta abaixo, em 2014, e seus defensores, logicamente, passaram a fingir que não haviam feito sua defesa, até com estardalhaço, durante a campanha. Aquele que acredita na existência de ciclos — que levariam àquilo que os políticos, adotando a linguagem da engenharia, denominam de “fadiga de material” — tende, se não a ficar inerte, a esperar que, de alguma maneira, o Céu o ajude a derrotar quem está no poder.
Em 2014, com uma campanha arrojada, movendo, empurrando e mudando a história, Marconi Perillo ganhou a eleição, derrotando, pela terceira vez, Iris Rezende. O que a oposição não havia percebido, quiçá por estribar suas teses na “teoria dos ciclos” (deveria ser chamada de “teoria da inércia”), é que Iris Rezende, um político desconectado dos tempos contemporâneos, era o adversário ideal para o tucano. Era previsível. Era o velho insistindo em ser velho — e não se está falando de idade — e tentando superar o novo que persistia novo. De alguma forma, o decano emedebista “remoçava” o projeto do (e o próprio) líder do PSDB.
O discurso de que um grupo está no poder há muitos anos e, por isso, será retirado de “lá” pelos eleitores pode até ser agradável aos ouvidos. Mas o que os eleitores observam, com olhos de lince e percepção aguçada, são as propostas e os históricos dos candidatos. O gestor que está fazendo, que está dinamizando o Estado e incorporando novas levas de indivíduos à cidadania — o programa Bolsa Universitária, com porta de entrada e porta de saída, não é mero assistencialismo; chega a ser quase liberal —, geralmente é vitorioso, derrubando a “teoria dos ciclos”. De fato, há grupos que envelhecem no poder — caso do PMDB em 1998, com Iris Rezende (a renovação era continuar com Maguito Vilela, então governador) — e grupos que não envelhecem ou envelhecem mantendo certa modernidade e conexão com a sociedade (há uma interlocução). O segundo parece ser o caso do tucanato em Goiás.
No início de abril, Marconi Perillo desincompatibilizou-se e José Eliton (PSDB) assumiu o governo. Era desconhecido. Em pouco tempo, com uma gestão ativa, buscando melhorar o dia a dia do indivíduo, começa a ser conhecido e, sobretudo, a ser avaliado positivamente. É visto como um gestor que está próximo das pessoas — é “gente como a gente”, dizem populares nos terminais de ônibus. Melhorar o policiamento nos terminais, reduzindo e até extinguindo os assaltos, parece não ser uma grande medida, especialmente para aqueles que circulam em Goiânia em automóveis próprios, de táxi ou de Uber. Entretanto, para os que usam o transporte coletivo e enfrentam as agruras do cotidiano, é uma ação de quem está preocupado com, por assim dizer, os “deserdados” — os indivíduos que estão à espera de serem incorporados à cidadania. Os que pagam planos de saúde por certo não têm muito interesse na informação de que o governo de Goiás está criando o terceiro turno (à noite) na área de saúde — cirurgias eletivas, por exemplo — para atender os indivíduos. São intervenções que mostram um governo ativo, vivo e em sintonia com a sociedade no seu sentido global.
O que José Eliton está mostrando é que, paralelamente à construção de obras (o programa Goiás na Frente), preocupa-se com o homem, com o indivíduo. Parece pouco? Não é. Porque políticos meramente tocadores de obra, sobretudo aqueles que querem transformar o mundo estruturalmente, esquecem que há um indivíduo — ainda não é um cidadão de maneira ampla — que precisa do amparo do Estado em questões básicas (como saúde e, até, alimentação).
José Eliton “renova” ou “esgota” o ciclo? No momento, a impressão que se tem é que “renova”. Mas é preciso verificar o que os eleitores dirão nas urnas. Adiante, o líder tucano será retomado, em especial para discutir que, se se pode falar em ciclo, talvez seja possível que abrirá uma porta para os políticos goianos mais jovens, se reeleito.
Ruralismo de Caiado
Ronaldo Caiado (DEM) é médico ortopedista — tido por seus pares como altamente gabaritado —, é fazendeiro e é senador. Deve ser incluído na lista dos políticos modernos? Sim, mas teria vínculos com setores arcaicos do ruralismo? O que se pode dizer é que presidiu a União Democrática Ruralista (UDR) e não é tolerante com os movimentos de trabalhadores sem-terra — que são um fato do capitalismo retardatário brasileiro e, por isso, não devem ser tratados, ao contrário do que querem alguns, com “caso de polícia”. Apesar da politização dos movimentos dos sem-terra, há um problema social que precede à ideologização à esquerda. Um governante não pode se preocupar tão-somente com os fazendeiros, porque o Estado não é ou não deve ser representante de classes sociais (grupos ou segmentos) específicas — deve, isto sim, ser um mediador social e se mostrar atento à diversidade da sociedade. Eleito governador, como se comportaria Ronaldo Caiado em relação aos movimentos sociais? Como reagiria a uma greve de professores e de médicos? Agiria com truculência? Talvez sim. Talvez não. Falta-lhe a moderação de um Tancredo Neves.
Se Caiado for eleito governador, fecha-se um “ciclo” na política de Goiás? Claro que ainda não se pode saber, porque a história está em andamento. Depende muito do fato de como, se vencer em outubro, governará o Estado. Se eleito e indo à reeleição, não abre espaço nem mesmo às novas forças dos seus grupos de aliados. E, se promover caça às bruxas, tende a paralisar o Estado durante pelos menos o primeiro ano — o que, para os goianos, não é um caminho saudável e, especialmente, produtivo. Um ciclo negativo pode travar a modernização da economia e das práticas políticas.
Já Daniel Vilela, embora vinculado a forças tradicionais da política de Goiás, representa um fato novo. Mas, se eleito, inaugura um “ciclo” político para si e para seu grupo? Na verdade, o emedebista, se vencer, abre um “ciclo” para si, mas não necessariamente para seus aliados. Com menos de 40 anos, vai tentar consolidar sua hegemonia como líder — o que fecha portas aos políticos emergentes.
Uma vitória de José Eliton, que não tem a possibilidade de disputar a reeleição, pode significar um pouco mais. Se reeleito em 2018, governará até 2022. Pode ficar até o final, dezembro, ou pode sair antes para disputar mandato de senador ou deputado federal. O que isto quer dizer?
Que, se reeleito, abre um novo “ciclo” político tanto para seus aliados quanto para seus adversários. Veja-se o caso do ministro das Cidades, Alexandre Baldy. Ele está trabalhando para montar uma estrutura com o objetivo de disputar o governo de Goiás em 2022 (ou talvez a Prefeitura de Goiânia em 2020). Se for este seu projeto, uma aliança é mais pragmática com José Eliton ou com Daniel Vilela?
José Eliton, que não será candidato a governador em 2022, pode até bancar Alexandre Baldy. Mas, se for eleito em 2018, Daniel Vilela terá como bancá-lo? Não. Porque disputará a reeleição (se esta, é claro, não cair). Eleito, o emedebista tentará construir seu “ciclo”, formatando seu núcleo de poder em torno de seus projetos futuros, tendo a reeleição como eixo principal.
O mesmo se dá com o próprio Daniel Vilela. Se ele perder agora, poderá disputar em 2022, mais amadurecido e com o campo mais aberto. Thiago Peixoto, Francisco Júnior, Virmondes Cruvinel, Marcos Abrão, Agenor Mariano, Andrey Azeredo, Alexandre Baldy, Antônio Gomide, Demóstenes Torres, João Campos, Henrique Arantes, José Antônio, Jean Carlo, Gustavo Sebba, Cristina Lopes, Vinicius Luz, Valmir Pedro, Vanderlan Cardoso, Heuler Cruvinel, entre outros, terão um campo aberto se o vitorioso for José Eliton (vale frisar que Marconi Perillo disse ao Jornal Opção que não pretende, depois de quatro vitórias, disputar mais o governo do Estado).
Não se trata de sugerir que um candidato é melhor do que o outro — até porque os quatro pré-candidatos, Ronaldo Caiado, José Eliton, Daniel Vilela e Kátia Maria (PT) são qualificados —, e sim de apontar uma questão que mesmo os políticos, sempre tão atentos, nem sempre percebem. A eleição de 2022 começa com a disputa de 2018. Quem acertar táticas e estratégias agora, firmando alianças duradouras e pactos de confiança, pode chegar na frente na disputa seguinte. É o que o Editorial está dizendo.
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